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A  crônica de Solange Pereira 

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mulheres no 08 de março

MINHA  LUTA

     Uma   mulher fala às “Otoridade”. De suas lutas, das contradições  dos Poderes  pouco seguros  na impessoalidade devida ao público e das tentativas de esmagamento quase institucional de uma individualidade que  não quer se situar nem entre cordeiras nem  entre lobos, mas existir como cidadã.  

 

    Seja nos órgãos públicos, nas autarquias, na vizinhança,  a agressão  moral, psicológica e física está presente na vida da mulher que ousa não baixar os olhos e chama a violência da misoginia, do sexismo e do oportunismo pelo nome, nas profundezas do sertão do Jequitinhonha.

Sr. JUIZ  DA COMARCA  

Jequitinhonha, 18 de maio de 2019

Ref. QUID  MEUS DIREITOS

Excelência,

   Venho respeitosa, mas firmemente, exprimir minha profunda indignação com o constante arquivamento das minhas petições, processos e TCO’s nesse Fórum de Jequitinhonha, que prejudicam meus direitos de ver considerados e protegidos minha integridade física e civil como cidadã, nesse vácuo da Lei que assim se forma, fazendo da minha pessoa um “pássaro livre”, segundo o conceito jurídico da Idade Média. e robustecendo a  cultura da violência  própria da nossa sociedade.

    Parece-me que minhas petições e processos como já tiveram oportunidade de exprimir junto a V. Exª em carta anterior, são tratadas com critérios especiosos, paralelos às exigências jurídicas, segundo o comentário acrescentado à mão, para apreciação do juiz, há mais de uma década, num dos processos: ”Essa mulher onde aparece causa confusão”.

      Leitura: não se comenta ali sobre uma cidadã, mas sobre uma coisa específica, uma mulher, elemento de segunda classe e de menor valia. Confusão seria tudo o que afeta a ordem instituída, mas instituída com quais critérios? Uma consideração moralista, saída do fundo de espíritos forjados numa sociedade machista e sem inibição a sê-lo. Indivíduos sob o manto do cargo que decidem de ‘per si “o que é justo ou injusto. E como o senhor pacientemente me esclareceu na audiência do 13/05, há que obedecer aos ritos e ordenamento da coisa jurídica. Mas na prática a teoria é diferente.

    

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

    Vivemos numa sociedade violenta, e a mulher é a vítima por excelência. São os pequenos vexames, as pequenas humilhações, as pequenas agressões físicas, morais e psicológicas, a obrigação das pequenas e grandes renúncias ao seu potencial intelectual. O feminicídio é o resultado lógico, e bem freqüente nas nossas plagas, dessa prática cotidiana do exercício de poder desbragado de uns sobre as outras. Ouço falar, nas audiências, da necessidade de “harmonia”, como se isso fosse possível numa sociedade composta de lobos e cordeiros.

      Respeito, dos cidadãos entre si, e das instituições face aos cidadãos, seria a base da paz social, a harmonia viria em seguida, quase naturalmente. É patético que funcionárias do Fórum publiquem no Facebook indignadas mensagens  sobre feminicidas  em julgamento, sem refletir no húmus  para futuras violências que é o próprio moralismo, de fundo machista -  que impregna, sim, o espírito feminino - no tratamento  da coisa forense. Veja-se o meu caso.

     

    Alguém como eu, com todas as características vistas como “desfavoráveis” nessa sociedade – mulher, idosa, sozinha – que deveria se conformar ao seu papel mais que secundário, e que, porém, fala, aponta, denuncia, age pelos seus direitos e se manifesta em praça pública, é um incômodo a ser eliminado, ou, no mínimo, desencorajado, pois “causa confusão”. Na linguagem corrente, Senhor Juiz, e peço vênia para repeti-la, mulher tem de “meter o rabo entre as pernas e fechar o bico”.  Senão a reprodução da violência não seria possível, não é mesmo? E seria o fim do predomínio de uns sobre as outras. (...)

    

   

     

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vivemos numa  sociedade violenta, onde a mulher continua  sendo a  vítima por excelência

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